Alguém já disse que uma das aventuras mais
fascinantes é acompanhar o ciclo das águas na Natureza. Suas reservas no
planeta são constantes, mas isso não é motivo para desperdiçá-la ou
mesmo poluí-la. A água que usamos para os mais variados fins é sempre a
mesma, ou seja, ela é responsável pelo funcionamento da grande máquina
que é a vida na Terra; sendo tudo isto movido pela energia solar.
Vista do espaço, a Terra parece o Planeta Água, pois
esta cobre 75% da superfície terrestre, formando os oceanos, rios, lagos
etc. No entanto, somente uma pequenina parte dessa água - da ordem de
113 trilhões de m3 - está à disposição da vida na Terra.
Apesar de parecer um número muito grande, a Terra corre o risco de não
mais dispor de água limpa, o que em última análise significa que a
grande máquina viva pode parar.
A água nunca é pura na Natureza, pois nela estão
dissolvidos gases, sais sólidos e íons. Dentro dessa complexa mistura,
há uma coleção variada de vida vegetal e animal, desde o fitoplâncton e o zooplâncton
até a baleia azul (maior mamífero do planeta). Dentro dessa gama de
variadas formas de vida, há organismos que dependem dela inclusive para
completar seu ciclo de vida (como ocorre com os insetos). Enfim, a água
é componente vital no sistema de sustentação da vida na Terra e por
isso deve ser preservada, mas nem sempre isso acontece. A sua poluição
impede a sobrevivência daqueles seres, causando também graves
conseqüências aos seres humanos.
A poluição da água indica que um ou mais de seus usos
foram prejudicados, podendo atingir o homem de forma direta, pois ela é
usada por este para ser bebida, para tomar banho, para lavar roupas e
utensílios e, principalmente, para sua alimentação e dos animais
domésticos. Além disso, abastece nossas cidades, sendo também utilizada
nas indústrias e na irrigação de plantações. Por isso, a água deve ter
aspecto limpo, pureza de gosto e estar isenta de microorganismos
patogênicos, o que é conseguido através do seu tratamento, desde da
retirada dos rios até a chegada nas residências urbanas ou rurais. A
água de um rio é considerada de boa qualidade quando apresenta menos de
mil coliformes fecais e menos de dez microorganismos patogênicos por
litro (como aqueles causadores de verminoses, cólera, esquistossomose,
febre tifóide, hepatite, leptospirose, poliomielite etc.). Portanto,
para a água se manter nessas condições, deve-se evitar sua contaminação
por resíduos, sejam eles agrícolas (de natureza química ou orgânica),
esgotos, resíduos industriais, lixo ou sedimentos vindos da erosão.
Sobre a contaminação agrícola temos, no primeiro
caso, os resíduos do uso de agrotóxicos (comum na agropecuária), que
provêm de uma prática muitas vezes desnecessária ou intensiva nos
campos, enviando grandes quantidades de substâncias tóxicas para os
rios através das chuvas, o mesmo ocorrendo com a eliminação do esterco
de animais criados em pastagens. No segundo caso, há o uso de adubos,
muitas vezes exagerado, que acabam por ser carregados pelas chuvas aos
rios locais, acarretando o aumento de nutrientes nestes pontos; isso
propicia a ocorrência de uma explosão de bactérias decompositoras que
consomem oxigênio, contribuindo ainda para diminuir a concentração do
mesmo na água, produzindo sulfeto de hidrogênio, um gás de cheiro muito
forte que, em grandes quantidades, é tóxico. Isso também afetaria as
formas superiores de vida animal e vegetal, que utilizam o oxigênio na
respiração, além das bactérias aeróbicas, que seriam impedidas de
decompor a matéria orgânica sem deixar odores nocivos através do consumo
de oxigênio.
Os resíduos gerados pelas indústrias, cidades e
atividades agrícolas são sólidos ou líquidos, tendo um potencial de
poluição muito grande. Os resíduos gerados pelas cidades, como lixo,
entulhos e produtos tóxicos são carreados para os rios com a ajuda das
chuvas. Os resíduos líquidos carregam poluentes orgânicos (que são mais
fáceis de ser controlados do que os inorgânicos, quando em pequena
quantidade). As indústrias produzem grande quantidade de resíduos em
seus processos, sendo uma parte retida pelas instalações de tratamento
da própria indústria, que retêm tanto resíduos sólidos quanto líquidos, e
a outra parte despejada no ambiente. No processo de tratamento dos
resíduos também é produzido outro resíduo chamado "chorume",
líquido que precisa novamente de tratamento e controle. As cidades podem
ser ainda poluídas pelas enxurradas, pelo lixo e pelo esgoto.
Enfim, a poluição das águas pode aparecer de vários
modos, incluindo a poluição térmica, que é a descarga de efluentes a
altas temperaturas, poluição física, que é a descarga de material em
suspensão, poluição biológica, que é a descarga de bactérias patogênicas
e vírus, e poluição química, que pode ocorrer por deficiência de
oxigênio, toxidez e eutrofização .
A eutrofização é causada por processos de erosão e decomposição que fazem aumentar o conteúdo de nutrientes, aumentando a produtividade biológica,
permitindo periódicas proliferações de algas, que tornam a água turva e
com isso podem causar deficiência de oxigênio pelo seu apodrecimento,
aumentando sua toxidez para os organismos que nela vivem (como os
peixes, que aparecem mortos junto a espumas tóxicas).
A poluição de águas nos países ricos é resultado da
maneira como a sociedade consumista está organizada para produzir e
desfrutar de sua riqueza, progresso material e bem-estar. Já nos países
pobres, a poluição é resultado da pobreza e da ausência de educação de
seus habitantes, que, assim, não têm base para exigir os seus direitos
de cidadãos, o que só tende a prejudicá-los, pois esta omissão na
reivindicação de seus direitos leva à impunidade às indústrias, que
poluem cada vez mais, e aos governantes, que também se aproveitam da
ausência da educação do povo e, em geral, fecham os olhos para a
questão, como se tal poluição não atingisse também a eles. A Educação
Ambiental vem justamente resgatar a cidadania para que o povo tome
consciência da necessidade da preservação do meio ambiente, que influi
diretamente na manutenção da sua qualidade de vida.
Dentro desse contexto, uma grande parcela da
contenção da "saúde das águas" cabe a nós, brasileiros, pois se a Terra
parece o Planeta Água, o Brasil poderia ser considerado sua capital, já
que é dotado de uma extensa rede de rios, e privilegiado por um clima
excepcional, que assegura chuvas abundantes e regulares em quase todo
seu território.
O Brasil dispõe de 15% de toda a água doce existente no mundo, ou seja, dos 113 trilhões de m3
disponíveis para a vida terrestre, 17 trilhões foram reservados ao
nosso país. No processo de reciclagem, quase a totalidade dessa água é
recolhida pelas nove grandes Bacias Hidrográficas aqui existentes. Como a água é necessária para dar continuidade ao crescimento econômico, as Bacias Hidrográficas
passam a ser áreas geográficas de preocupação de todos os agentes e
interesses públicos e privados, pois elas passam por várias cidades,
propriedades agrícolas e indústrias. No entanto, a presença de alguns
produtos químicos industriais e agrícolas (agrotóxicos) podem impedir a
purificação natural da água (reciclagem) e, nesse caso, só a construção
de sofisticados sistemas de tratamento permitiriam a retenção de
compostos químicos nocivos à saúde humana, aos peixes e à vegetação.
Quanto melhor é a água de um rio, ou seja, quanto
mais esforços forem feitos no sentido de que ela seja preservada (tendo
como instrumento principal de conscientização da população a Educação
Ambiental), melhor e mais barato será o tratamento desta e, com isso, a
população só terá a ganhar. Mas parece que a preocupação dos técnicos em
geral é sofisticar cada vez mais os tratamentos de água, ao invés de se
aterem mais à preservação dos mananciais, de onde é retirada água pura.
Este é o raciocínio - mais irracional - de que a técnica pode fazer
tudo. Técnicas sofisticadíssimas estão sendo desenvolvidas para permitir
a reutilização da água no abastecimento público, não percebendo que a
ingestão de um líquido tratado com tal grau de sofisticação pode ser
tudo, menos o alimento vital do qual o ser humano necessita. Ou seja, de
que adianta o progresso se não há qualidade de vida? A única medida
mitigadora possível para este problema, na situação grave em que o
consumo da água se encontra, foi misturar e fornecer à população uma
água de boa procedência com outra de procedência pior, cuidadosamente
tratada e controlada. Vejam a que ponto tivemos que chegar.
Portanto, a meta imediata é preservar os poucos
mananciais intactos que ainda restam para que o homem possa dispor de um
reservatório de água potável para que possa sobreviver nos próximos
milênios.
Texto: | Dr.ª Sônia Lúcia Modesto Zampieron |
Biólogo João Luís de Abreu Vieira |
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